A Casa Neon Cunha acaba de dar mais um passo para enfrentar um dos maiores desafios da população LGBTQIA+: o apagamento. Com duração de 12 meses e investimento de R$ 350 mil, a organização lança o projeto “História e Memória LGBTQIA+ no Grande ABC”, uma iniciativa que vai mapear, documentar e divulgar a trajetória da comunidade na região, conectando passado, presente e futuro.
A partir desse levantamento, será criado um acervo digital aberto ao público e um documentário com depoimentos de pessoas que marcaram a história da resistência LGBTQIA+ no Grande ABC, em diferentes áreas: política, cultura, movimento social, academia, territórios populares e mundo do trabalho.
O que o projeto vai fazer na prática
Na primeira etapa, com duração de 12 meses, o projeto prevê:
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Entrevistas em estúdio com lideranças, militantes, artistas e pesquisadoras da região;
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Coleta, organização e digitalização de documentos, fotos, cartazes, materiais de campanha e registros pessoais;
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Pesquisa bibliográfica em arquivos físicos e digitais;
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Levantamento de reportagens e conteúdos jornalísticos sobre a população LGBTQIA+ no Grande ABC;
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Sistematização desse material em um acervo virtual de livre acesso.
O projeto é financiado por uma emenda parlamentar estadual indicada pelo deputado Luiz Claudio Marcolino (PT), por meio do Governo do Estado de São Paulo e da Secretaria de Cultura, Economia e Indústria Criativas. O investimento de R$ 350 mil possibilita estruturar equipe, pesquisa de campo, locação de estúdio e equipamentos de audiovisual para a realização de mais de 30 entrevistas em profundidade.
Da universidade para a Casa Neon Cunha
A coordenação do projeto é de Rai Neres, diretor da Casa Neon Cunha e pesquisador responsável por um levantamento histórico sobre a população LGBTQIA+ no Grande ABC, realizado na Universidade Federal do ABC (UFABC).
Sua pesquisa, que abrange o período de 1960 a 2020, resultou em um acervo físico preservado na universidade. Agora, esse trabalho ganha fôlego e novo endereço.
“Sem possibilidade de continuidade dentro da universidade, decidimos seguir com esse projeto na Casa Neon Cunha e disponibilizar o material ao público, para que mais pessoas tenham acesso a essa história”, explica Rai.
A partir dessa base, o projeto amplia o olhar e atualiza o recorte histórico, valorizando as vivências de quem construiu a luta LGBTQIA+ na região — muitas vezes sem reconhecimento institucional.
Ditadura, luta operária, cultura e direitos: um outro jeito de contar a história do ABC
Quando se fala em Grande ABC, quase sempre a narrativa oficial destaca a indústria, o sindicato, o automóvel. O projeto “História e Memória LGBTQIA+ no Grande ABC” quer mostrar que essa história também foi construída por corpos dissidentes.
Segundo Rai, temas como:
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luta operária,
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ditadura militar na região,
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dinâmica territorial da população LGBTQIA+,
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cena artística e cultural,
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construção de direitos e políticas públicas
serão atravessados pelo olhar da comunidade LGBTQIA+.
“Queremos contar como a história LGBTQIA+ está interligada a esses temas. Não existe luta por democracia, por direitos trabalhistas ou por cultura viva sem a presença de pessoas LGBTQIA+. Vamos mostrar como essa população ocupou as cidades, como foi empurrada para certas áreas, como a arte virou ferramenta de resistência e como a política institucional respondeu – ou silenciou – essas existências”, afirma o coordenador.
Acervo virtual, documentário e próximos passos
A primeira etapa do projeto está prevista para ser concluída em setembro deste ano, com a organização do acervo digital e a gravação das entrevistas em vídeo.
A equipe também estuda a possibilidade de buscar uma nova emenda parlamentar para garantir a continuidade e expansão da iniciativa.
Entre os objetivos para as próximas fases estão:
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Lançar um site próprio dedicado ao acervo de História e Memória LGBTQIA+ no Grande ABC;
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Finalizar e divulgar o documentário com depoimentos de pessoas da região;
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Ampliar o acesso público ao material, com atividades formativas, rodas de conversa e ações em escolas, universidades e equipamentos culturais.
“Nesta primeira fase, o recurso foi destinado principalmente à contratação da equipe de pesquisa, à locação de estúdio de gravação e ao aluguel de equipamentos de audiovisual. A ideia é que esse seja apenas o começo de um observatório vivo da memória LGBTQIA+ no território”, completa Rai.





